| DIOGO MENDES | ( @diogmends )

Quando, por uma infinidade de fatores, o cérebro de alguém não consegue decodificar uma realidade hostil entra em estado catatônico. Pandemias, guerras, crimes acarretam em várias pessoas essa mesma reação psicológica, de não continuar interagindo, da maneira semelhante de antes.
No filme Ódio (1977) de Carlo Mossy levanta questionamentos sobre revolta, perversão e liberdade seletiva. Durante 102 minutos, em vários momentos, o choque se instaura, não pelo explícito da violência, de outro modo através das sugestões de um crime praticado entre pessoas conhecidas.
Estupro, pedofilia, morte são o que a Família Barcelos, suporta na primeira meia hora de longa, ao passo que presencia, o idealista advogado e professor de direito Roberto Barcelos. Vai do auge, a ser o único sobrevivente desse massacre, realizado por empregados da fazenda que cresceu, com história original de Talita Valle.
De trilha sonora encorpada, igual à própria narrativa, o filme tem roteiro de Sanin Cherques, Ismar Porto e Carlo Mossy. Com nomes no elenco, Carlo Mossy, Átila Iório, Ana Paula Lombardi, Celso Faria, Cleia Simões, Estelita Bell, Fátima Freire, Sergio Guterres, Fernando Reski e demais pessoas.

Pouco sendo novidade desde a estreia de Ódio, diretores atuarem como protagonistas de suas produções. O filme possui artes visuais compostas por Rudi Böhm, que potencializam a complexidade da história, narrada em diferentes frentes por Carlo Mossy, taxado apenas de “O Rei da Pornochanchada”.
Com interpretações cabais, o longa-metragem foge de um superficial banho de sangue, trazendo um enfoque antropológico do crime. Já que Nestor, Geraldão, Léo e Souza, cometeram todas as violências, frustrados pelo viés social, ou no que acostuma no país, precariedade de vida.
Larga advocacia e academia, depois de receber alta do hospital, Roberto (Carlo Mossy) começa a perambular pela cidade do Rio de Janeiro, não apresenta forças de voltar à fazenda, onde aconteceu o crime que matou sua mãe (Lídia Vani), irmã (Ana Paula Lombardi), pai (Jayme Barcellos) e a funcionária Almerinda (Cleia Simões).
Vagando, procura outras regiões da cidade que evitava, apesar de sempre fantasiá-las. Em uma birosca de sinuca, no filme Ódio, conhece Tony (Sergio Guterres), justamente quando vê a justiça que tanto acredita não sendo aplicada, igual não foi com sua família, e compra aquela briga.
A relação de Roberto e Tony, inicia confusa e desigual, Roberto teve tudo, exceto a prática da justiça, Tony teve nada, à medida que desenvolve um particular código de conduta. Na pensão de Dona Aracy (Lícia Magna), conhece a personagem queer Vanusa (Fernando Reski), que é fã da banda Secos e Molhados.
Toda à proteção, afasta Roberto que despontava à sua maneira um plano de vingança. Algo paliativo, embora, faça ele aguentar a dor da perda das pessoas que ama, logo em função de bisbilhotar os pertences do protagonista, Vanusa descobre de onde lembra daquele rosto.
Entre a fluidez sexual e de gênero carioca em Ódio, de Roberto, Tony, Vanusa e Diva (Maralisi), os ex-colonos são encontrados um a um. A vingança de Roberto, ocorre pelo agravamento psicológico de quem persegue, e consigo, na teoria e na prática não alcançadas, que tenta continuar vivo.
Com Souza (Jotta Barroso), é o primeiro que Roberto acha, vive desempregado e dependente alcoólico, aumentando por causa do crime. Mora junto da esposa, que tem saúde debilitada pela asma, doença de gota e varizes, apresenta ele medo de ser descoberto, opta ao suicídio.
Na sequência, Léo (Ivan de Almeida) tenta equilibrar as contas trabalhando como soldador, e lamenta ser um dos comparsas que pouco “lucrou”. O lixamento dele por apedrejamento, por mais que também tenha sido praticado por alguns negros, tem motivação racista, o filme considera.
Dependente químico, o traficante Geraldão (Átila Iório), esconde-se na Comunidade de São João, receoso de a qualquer momento ser responsabilizado. Acaba tendo um dos sequenciamentos de cenas mais impactantes, inclusive sua morte, enquanto depara com Roberto.
Melhor sucedido no financeiro, que seus comparsas, Nestor (Celso Faria) foi “articulador” da violência. Talvez, o mais cruel, premedita cada uma das ações, até chegar ao objetivo, estado de graça do dinheiro, aliás abocanhado. O filme Ódio aniquila vez de humanidade.
~ ASSISTA:
Entraves técnicos de efeitos especiais, são solucionados por Antônio Pacheco, na película que forneceu cenas notáveis, às minuciosas externas e internas. Outrossim soube, pensar um dos momentos de industrializações do Brasil, em que deixava de ser rural para mais urbano.
Maldade que paralisa, não resolveu as incoerências do personagem principal, mesmo tendo a chance de seguir em frente, ainda escolhe as feridas do passado. Obsoleto, tornou aquele mundo, onde ele libertava os pássaros das gaiolas das outras pessoas, pouco aplicando à premissa para si.